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Uma notícia comum


Caetano,


Era para ser apenas um domingo feliz. Nosso primeiro dia dos pais. Mas o dia começou com uma notícia ruim. Seu tio e três amigas foram vítimas de um assalto à mão armada. Tudo aconteceu aqui pertinho de casa, em uma área movimentada da cidade, próximo a uma casa noturna lotada. Ficamos felizes porque as perdas foram apenas materiais. Um carro. Um celular. Uma carteira. O que vale isso, afinal? Um fato trivial. Uma notícia comum. Mas dessa vez ela mexeu comigo de uma forma diferente. Não por ter acontecido com meu irmão. Já aconteceu comigo, com seu avô, com sua avó e com tantas outras pessoas próximas ou distantes. Conhecidos e desconhecidos. Acontece todo dia. Uma notícia comum.


Um fato trivial. Mas dessa vez é realmente diferente. É diferente porque eu ando mudada. Agora sou mãe e a notícia tão comum bateu de forma arrebatadora. Diante dela, senti uma angústia nunca antes sentida, um aperto que começou na barriga, subiu pelo peito e chegou até os olhos, junto com uma vontade absurda de chorar. Temi por você, meu filho. Pelo país em que você irá crescer. Pelo mundo em que você nasceu. Penso mais uma vez em como gostaria de me mudar. Já conheci e vivi em realidades muito melhores. Mas nem lá fora as coisas andam tão boas assim. Não existe mais lugar para tranquilidade, principalmente em um coração de mãe. O mundo anda doente, meu filho. E eu só espero que no dia em que você possa ler essa carta, as coisas já não estejam mais tão ruins. Andam me cobrando um pouco da parte ruim da maternidade nos meus textos. Afinal, tenho falado muito do paraíso e pouco do padecer. Sim, já tivemos alguns momentos difíceis. É normal. Faz parte. Mas hoje foi diferente. Porque ser acordada de madrugada para amamentar não é tão mal assim. Ruim é, acordar às três da manhã e ser lembrada de que você deu vida a um filho em um mundo tão violento. Isso não tem nada de natural. Dói fundo. Amedronta. Mas afinal, podemos comemorar. Não foi nada. Apenas perdas materiais. Apenas mais um trauma. Uma notícia comum.


Um fato trivial. E meu coração de mãe, hoje apertado, mais uma vez irá se acostumar. Até ser lembrado de novo. E de novo... De fato, para uma mãe, não existe mais lugar para tranquilidade.

      Flávia Vilhena
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Sou a Flávia. Mãe do Caetano e do Augusto. Viajante, ex-blogueira (de viagem), advogada e agora escritora...

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