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O mito da mulher multitarefas



Se me perguntassem, dois anos atrás, eu responderia que sou uma mulher multitarefas de atenção difusa. Com muito orgulho, obrigada.


Eu costumava trabalhar com pelo menos cinco janelas do navegador abertas. Parava um e-mail no meio para ler uma notícia. Interrompia a frase de uma petição para checar o WhatsApp e era capaz de ouvir um caso enquanto respondia a uma mensagem. Isso é que é produtividade, hein?!


Pura mentira.


Hoje trabalho com um post it na minha tela, me lembrando sobre a importância/necessidade/urgência/única opção possível e viável: uma coisa de cada vez, por favor!!!


Não, eu não sou multitarefas, e atenção difusa é a história, oops, a ladainha, que contei para mim mesma para poder dar conta de tudo que eu julgava necessário nas vinte e quatro improrrogáveis horas do meu dia.


Atualmente é muito convidativa, quase uma imposição, a ideia de que precisamos ser saudáveis, independentes, cultas, saradas, inteligentes, antenadas, boas profissionais e mães, e amigas e filhas e amantes e mulheres maravilha. Mas isso é só o básico. Para ter borogodó, aquele algo mais, tem que cuidar da casa, do marido, do cachorro, do papagaio, do periquito. Tem que ser bonita, o que implica em unhas feitas, cabelo impecável, depilação em dia, sem rugas ou marcas de expressão e sem aquele fio que insiste em nascer de três em três dias no meio da sobrancelha. Também tem que ter estilo, falar línguas, ler russo, cozinhar a própria comida (sem glúten, sem farinha, sem gordura, sem vida), saber balancear abacate com bacon e entender tudo sobre Nutrição, mesmo tendo escolhido fazer Direito. Tem que ter assistido os últimos episódios daquela série de treze temporadas. E os da série de uma temporada só também. Tem que ter repertório, estar por dentro das últimas notícias. As do Brasil, as dos Estados Unidos, as da Europa, da China e as do Tuvalu (nunca ouviu falar no Tuvalu? Ahá! Tá precisando estudar.). Tem também que ouvir boa música, saber dançar, entender de vinho e cinema, viajar. Quando se tem filhos, tem que dar conta de tudo isso em dobro (ou em triplo, quádruplo e por aí vai). Tem que levar na escola, na natação, no balé, no judô, no futebol, no inglês, na aula de programação e fazer a curadoria de tudo o que foi dito acima, para que seus filhos se tornem um ser de luz ainda mais especial que você. Ah! E sem telas!!! Com presença e tempo de qualidade. Óbvio, sem terceirização. É bom garantir também no mínimo oito horas de sono por dia, se não você não consegue fazer nada disso e vive muitos anos a menos. Sim, sinto muito. As vinte e quatro horas na realidade são apenas dezesseis. Se bem que tem a carreira, né? Oito horas a menos. No mínimo. Mas tá tudo bem, ainda sobraram oito. E não podemos deixar de lembrar da saúde mental: meditação, mindfulness, Yoga. Nossa! Já ia me esquecendo da academia. Ufa! Acho que agora já deu para me tornar uma pessoa um pouquinho interessante e adequada. Mas claro que isso não tem valor nenhum se não for compartilhado, então, para finalizar o dia, só é preciso postar e rolar o feed das oito redes sociais... Comendo uma lata de leite condensado às três e meia da manhã.


Mas será que a gente precisa mesmo ser tudo isso?


Do que você precisa, eu não sei, mas que é impossível ser essa pessoa aí de cima, isso eu garanto. E eu também posso afirmar que a mínima tentativa de fazer tudo isso é garantia de que será tudo muito mal feito. E aí cabe a cada um decidir o que é realmente essencial para si.

Isso pode parecer simples, mas não é. Nem um pouquinho. Porque para descobrir a essência, é preciso se conhecer e se conhecer dá um trabalho danado! Aliás, a maneira mais fácil de nos afastarmos do autoconhecimento é justamente passar a vida no piloto automático de quem realiza mil tarefas ao mesmo tempo e chega ao fim do dia, do mês, do ano, da década e sim, da vida, sem saber exatamente o que andava fazendo por aí.


É urgente parar.


Uma coisa de cada vez, com muito orgulho, obrigada.

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      Flávia Vilhena
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Sou a Flávia. Mãe do Caetano e do Augusto. Viajante, ex-blogueira (de viagem), advogada e agora escritora...

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